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sábado, 10 de maio de 2014

ERNST BLOCH: A ESPERANÇA



Gerson N. L. Schulz
Professor de Filosofia


Ainda não é noite o dia todo, 
ainda há uma manhã para cada noite.

Ernst Bloch




Pode ser no "ano novo", pode ser no final de semana, na saída de uma missa, de um culto, em uma segunda-feira qualquer, depois do carnaval, depois de perder o emprego, depois de uma briga com alguém, mas há no homem e na mulher um "motor" que faz com que ele e ela se movam e se renovem: é a esperança. A esperança renova a vontade de viver, a fé (para os que têm crença religiosa), a verdade (para os que buscam-na), a cura para o doente, a razão para o louco! E para falar em "esperança" ninguém melhor do que um pensador alemão do século XX chamado Ernst Bloch (1885-1977).

Bloch foi um filósofo marxista de origem judaica. Ele lecionou na Universidade de Leipzig mas, com a ascensão de Hitler ao poder em 1933, exilou-se nos Estados Unidos e só regressou à Alemanha Oriental em 1948, porém radicou-se definitivamente na Alemanha Ocidental dez anos depois onde continuou sendo professor na Universidade de Tübingen.

O marxismo de Bloch foi influenciado pelo romantismo alemão de George Hegel (1770-1831) e pela tradição judaico-cristã. Assim, o princípio fundamental de sua filosofia é a esperança (Hoffnung, em alemão). Para Bloch a história é algo que vai se fazendo de acordo com o princípio da esperança humana. Para ele a consciência é "consciência antecipadora" das coisas, do porvir. E é em "O Princípio Esperança" (1954-1959), em três volumes, que ele define o que é esperança.

Esperança, para o filósofo, não é mera ilusão, emoção infundada e até irracional como pensavam os gregos da escola estóica (para quem o princípio de uma vida feliz estava na ataraxia). Ernst Bloch diz que a esperança é uma emoção e é sempre positiva, daí, para ele, a possibilidade de ela ser a mola da história. Isto é, ninguém comete uma ação: pensar, planejar, viver, caso não tenha "esperança" de pôr seus planos em prática. Então a esperança é uma emoção positiva porque leva alguém de um ponto zero a um ponto infinito. Ela motiva a própria existência humana a sair do que é agora para algo que ainda não é. A sair da ataraxia, do estado de conforto. Ela é responsável, assim, pela transformação.

Mas esperança para Bloch também é o principio vital para se superar a servidão e as estruturas hierárquicas injustas da sociedade contemporânea. Logo, a esperança é militante, é transformadora da sociedade, dos valores, da cultura. O princípio da esperança é que ela não é aquilo que se deixa abalar por uma decepção qualquer, pois se isso acontece, não é esperança, é ilusão, fracasso! A esperança positiva leva o homem à utopia, ao sonho, mas não a um sonho qualquer (onírico), e sim ao sonho da própria existência e de torná-la absolutamente significativa. Bloch dá à esperança o papel de militância, ela serve, assim, como instrumento que deve garantir e promover a luta contra a opressão social, contra as humilhações e ofensas que o sistema político-industrial-militar impinge aos cidadãos. A esperança deve permitir ao homem andar de cabeça ereta e confiante em si mesmo, mas sem a arrogância. A esperança é, assim, aquilo que leva a um humanismo real, e tal humanismo só pode ser concreto, juntamente com a esperança, se o outro for considerado como igual, como ser humano que tem, como todos, os mesmos direitos, porém com o respeito a sua alteridade.

Como a esperança é um sentimento, é mais fácil renová-la nas datas que servem, simbolicamente, de referência para a mudança, como é o caso do ano novo, de um aniversário, de um acontecimento importante na vida de uma pessoa. A esperança é reinício; é um rito de passagem do agora para o depois que ainda não é. Mas esperança é também a possibilidade do perdão, do amor para que daí haja o renascimento. O faminto espera o que comer. Quem não tem moradia espera o lugar para viver. O doente espera a cura.

Por fim, como a Phoenix que renasce sempre das próprias cinzas, a esperança faz os seres humanos se levantarem todos os dias em busca de uma vida melhor de acordo, porém, com aquilo que seu horizonte de esperança permitir.