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sábado, 6 de abril de 2013

DITADURA, NÃO!

OPINIÃO POLÍTICA

Por: Gerson Nei Lemos Schulz
Prof. universitário de Filosofia

"Não sou favorável a qualquer tipo de ditadura, 
seja de 
'direita', seja de 'esquerda'. 
Ditadura, não!"




Nessa semana, alguns círculos comemoram o golpe militar orquestrado por um grupo de oficiais do exército brasileiro na madrugada do dia 31 de março para o dia 1° de abril de 1964. Esse grupo era contrário ao governo, em estilo populista, do presidente João Goulart. Também, de acordo com documentos secretos norte-americanos, liberados em 2004 pelo "The National Security Archives", dos E.U.A, o golpe teve amplo apoio dos Estados Unidos, por meio de seu embaixador aqui no Brasil, Lincoln Gordon. Os norte-americanos liberaram dinheiro e montaram uma operação chamada "Brother Sam" que disponibilizou uma frota (pronta para invadir o Brasil) e apoiar o golpe - golpe este que os militares insistem em chamar de "revolução", coisa que não é - porque uma revolução é a mudança radical da cultura, da estrutura política, econômica e social, algo que não aconteceu no Brasil que já havia sofrido a ditadura civil-militar do governo Vargas. 

De acordo com o documentário de Flávio e Camilo Tavares - "O dia que durou 21 anos", Lincoln Gordon enviou dezenas de relatórios para Washington, para alertar sobre o "perigo" de se formar um governo comunista no Brasil. Perigo que só existia, na época, na fantasia de lideranças da igreja católica e de poucos círculos militares, tanto que o golpe começou em Juiz de Fora - MG, uma cidade periférica do centro de poder das decisões nacionais. Jango poderia ter esmagado o movimento, mas preferiu fugir para o Uruguai. Questões como: "ele fugiria se sentisse que, de fato, tinha apoio para implantar aqui um regime socialista?" Ou: "caso sentisse que tinha consigo o apoio incondicional dos poucos movimentos sociais da época, não teria ele, Jango, dado o "golpe" comunista como alguns temiam? Além disso, inclusive, Jango tinha o apoio de boa parte dos oficiais do exército na ocasião, (do Brigadeiro Rui Moreira Lima; do Comandante do III Exército, José Machado Lopes; do Sr. Ivan Proença, oficial da Guarda Presidencial e etc.), especialmente no que tangia às reformas de base, como a reforma agrária (que até hoje presidente algum realizou com competência no Brasil) que poderiam levar o país, a médio prazo, a uma posição econômica respeitável.

Como professor de filosofia não posso aceitar uma ditadura de qualquer natureza, nem, supostamente de "direita", como foi no Brasil, Chile, Argentina; como é em Myanmar; Arábia Saudita - onde a mesma família está no poder desde 1932 -; Angola; Irã - que na prática é liderada pelo poder teocrático - ou Zimbábue. Nem, supostamente, de "esquerda" como ocorre em Cuba, Laos, China, Coréia do Norte. Assim, penso que o golpe de Estado de 1964 é uma mancha vergonhosa na história do Brasil. Supressão de liberdades, torturas, prisões, condenações sem julgamento, assassinatos, atos Institucionais da idade da pedra - especialmente o AI-5.

Mancha porque, na época, as forças armadas e policiais foram usadas por um grupo de pessoas que as viam como vassalos acéfalos dentro da hierarquia militar. Em qualquer país civilizado onde o exército já se profissionalizou, as forças armadas sabem que não são feitas para comandar governos. Que são feitas para servir ao povo e não massacrar seus próprios compatriotas desarmados! Será que a hierarquia militar subordina o sujeito a "não pensar por si", tornando-o "acéfalo"? Será que se os militares subalternos pudessem pensar, naquela ocasião, não teriam - em sua maioria - impedido o disparate de seu comandante, Olímpio Mourão Filho, de marchar até o Rio de Janeiro?

Na Alemanha atual é expressamente proibido tocar o hino do partido nazista, o hino da juventude hitlerista, fazer qualquer menção direta ao nome de Hitler e usar ou divulgar símbolos nazistas pela Lei N° § 86a StGB. O mesmo se dá no Brasil quanto ao nazismo, no texto da Lei Nº 9.459, de 13 de maio de 1997, em seu Artigo 20, § 1º. O nazismo não ocorreu no Brasil, não tivemos holocausto, mas tivemos torturas, violação dos direitos humanos e, usando palavras de hoje, terrorismo de Estado, por que, então, não lançar aqui uma lei para proibir a comemoração do golpe de 1964, bem como seus símbolos, como faz a Alemanha democrática atualmente? A Alemanha faz isso para garantir seu futuro como nação no mundo civilizado, a participação efetiva de seus cidadãos e a liberdade individual. Não devíamos proibir aqui também qualquer menção positiva ao 1964?

Condenar o golpe militar de 1964, e qualquer outro, é dignificar a democracia e consolidá-la.
É falacioso o argumento que diz que fazer isso é antidemocrático porque um golpe de Estado, necessariamente, assassina a democracia quando impede a maioria de expressar o que pensa, pois a democracia é para a maioria, não para um grupo. Então, embora com limitações, dentro de nosso modelo democrático, é lícito, sim, abafar o pequeno grupo que comemora o golpe. Como é também lícito publicar e julgar os crimes cometidos naquele período, pois até hoje há famílias que não enterraram seus mortos, assassinados por militares daquela época. Além de civis, há também militares que foram assassinados naquele período por se opor ao regime.
Seria uma omissão do poder público negar ou esquecer tais crimes assim como é uma omissão dos militares de hoje não revelarem os crimes cometidos, caso tenham em seu poder algum documento ou informação sobre o paradeiro de vítimas. Do ponto de vista moral, ético e do Direito, torturador deve ser punido, não importando a idade que tenha, porque continua sendo criminoso. Cabe ao Estado, por meio de seu poder judiciário, investigar e esclarecer os fatos.

Em respeito às vítimas de 1964, este texto é curto, pois as imagens a ele vinculadas falam mais que mil palavras e condenam todos aqueles que ainda insistem em apoiar um golpe.
Nada contra os militares de hoje - que não tomaram parte naquilo - mas os de 1964 sempre serão lembrados com indignação e como fantoches manipuláveis e acéfalos. O golpe de 1º de abril foi dado no dia dos bobos! Bobo foi quem acreditou que derrubando Jango, estava defendendo o Brasil e que Castelo Branco cumpriria a palavra que deu, ao dizer - no Congresso - que defenderia a democracia, entregando, depois de passada a crise, o poder de volta aos civis, algo que ele nunca fez, como provou a história. 
Quem ganhou com o golpe? Alguns oficiais, os Estados Unidos da América, os grandes investidores estrangeiros, cujas empresas lucravam aqui até 900%. Já o militar da "base", o soldado sem estrelas que teve que cumprir ordens e fazer o "serviço sujo", ficou "a ver o navio da história a atropelá-lo".