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sábado, 11 de setembro de 2010

A FILOSOFIA PARA CRIANÇAS


Gerson Nei Lemos Schulz



No Brasil ainda é novidade, mas nos E.U.A há o Institute for the Advancement of Philosophy for Children que se preocupa com o desenvolvimento do raciocínio infantil. Por isso Mathew Lipman se preocupou com o ensino de filosofia nas séries iniciais. Para ele, desde suas origens, a filosofia tem sido a única disciplina capaz de dar os critérios que tornam possível distinguir entre bons e maus raciocínios. Ela também se preocupa com o desenvolvimento das habilidades de raciocínio, o esclarecimento de conceitos, a análise dos significados e com o cultivo de atitudes que levam a questionar, investigar e tentar, de várias maneiras, buscar os significados e a verdade.

Mathew Lipman
1922-2010
Lipman diz que o pedagogo não pode ensinar filosofia porque há disciplinas que ele não domina como a lógica, por exemplo. Então pergunta: sem saber lógica, como alguém poderá pensar criticamente? Por isso propõe a filosofia para crianças que parte do ensino da lógica formal por meio de novelas (pequenas histórias envolvendo problemas do dia-a-dia). Essas novelas filosóficas buscam desenvolver na criança o pensamento crítico. Mas que pensamento crítico? Fazer com que a criança aprenda a comprovar seus argumentos.

Por exemplo, depois de ler e encenar uma novelinha filosófica sobre o conhecimento científico e o conhecimento de senso-comum onde os personagens são: a Terra, a Lua e o Sol, o professor pode organizar um debate e por à prova as curiosidades da turma. Quando o professor percebe que algumas opiniões são errôneas, ele não dirá ao aluno que ele está errado. Assim, algum aluno pode afirmar que: "o Sol gira em torno da Terra." E outro pode dizer: " Não, é a Terra que gira em torno do Sol." Então o professor expõe as duas opiniões à classe que refletirá com base na novela que acabou de ler. Caso não saiba responder, o professor pede ao aluno que deu a primeira resposta para comprovar o que está dizendo. O aluno pode argumentar que quando ele está com seu pai num barco no rio Amazonas, às seis da manhã, o Sol se 'levanta'. – Ok! Essa é uma boa resposta. Dirá o professor. – Afinal, há lógica aí e a humanidade pensou que isso era certo durante todo o medievo.

Por outro lado, o professor pedirá à classe para refletir sobre o argumento do colega. Enquanto solicita ao outro que disse que a Terra gira em torno do Sol que comprove. Ele poderá afirmar: "a novelinha mostrou que nos eclipses lunares é a sombra da Terra que 'tapa' a Lua." – Outra resposta excelente! Poderá arrematar o professor. E aí? Pergunta-se às crianças. "Quem tem razão?"

Outro aluno(a) pode intervir: "A minha mãe disse que é o Sol que gira em torno da Terra." Outro(a) colega pode ponderar: "Quando acontece o eclipse do Sol é a Lua que 'tapa' o Sol." E ainda outro pode cogitar: "Eu visitei um planetário e vi que todos os planetas giram em torno do Sol." Por meio do método indutivo, o professor ajuntará os argumentos favoráveis à tese, e contrários para debater.

Enfim, o professor é mediador na discussão, não senhor da verdade. A tese que tiver a seu favor mais argumentos comprovados, vence. Então, no debate filosófico, são apontadas teses e antíteses que convergem para a síntese que se abre para nova tese.

segunda-feira, 6 de setembro de 2010

A TENDÊNCIA LIBERAL E SUAS INFLUÊNCIAS NA ESCOLA TRADICIONAL

Gerson Nei Lemos Schulz



A escola tradicional nasce com a Modernidade por volta do século XVI. Ela é profundamente influenciada pela tendência liberal de educação (liberal no sentido econômico, filosófico, social). Inicialmente a escola tradicional, como se conhece hoje, era revolucionária como é o caso da proposta de Comênio (1592-1670).
A escola tradicional que nasce com a Modernidade acusava a escola medieval de ser contemplativa, desvinculada do mundo real (do mundo moderno voltado para o comércio e para a indústria), de ser de inspiração religiosa, preocupada em formar uma classe de "nobres" que rapidamente caminhava para a falência.
Com o crescimento da classe burguesa, em ascensão, precisava-se de uma escola dinâmica, voltada para aquele mundo em rápida mudança, que formasse técnicos capacitados para o comércio e atividades industriais. Conseqüentemente surgiu também outra classe que não era proprietária dos meios de produção (os trabalhadores assalariados), e eles também precisavam de formação (mas de uma formação rasteira como o aprendizado dos rudimentos da escrita e do cálculo).
Aí aparece uma divisão na escola porque algumas se preocupam com o ensino dos ricos e outras com o ensino dos pobres. De acordo com Gadotti (História das Idéias Pedagógicas, 2005), a partir de Napoleão Bonaparte o Estado assume a educação visando fomentar o desenvolvimento das novas ciências: física, química, biologia.
Para Aranha (Filosofia da Educação, 1996) a dinâmica da escola tradicional quanto à relação professor aluno é magistrocêntrica (centrada no professor). O professor é inquestionável, detentor do conhecimento, modelo a ser seguido. Ele controla o processo de ensino e aprendizagem. O aluno é mero receptor de conteúdos. É passivo diante de um conhecimento pré-concebido e que é inquestionável porque tem valor comercial ou industrial.
A disciplina adquire grande valor e o esforço intelectual individual se sobrepõe ao coletivo, isto é, cria-se todo um conjunto de punições para castigar os perdedores (aqueles que não se saem bem nas provas) e de recompensas para premiar os mais competentes que obtém sucesso nas avaliações. Logo, esse tipo de escola é bastante seletivo e até hoje, baseado nele, tem-se o vestibular.
Quanto ao método, baseia-se em aulas expositivas. O professor ministra conteúdos e depois "cobra de volta" na prova. O modelo também privilegia a memorização de informações mais que sua crítica. Para Gadotti (2005) esse seria o principal defeito do modelo tradicional.
A escola tradicional foi adotada pelos jesuítas, protestantes, iluministas e no século XIX pelos positivistas com Augusto Comte (1798-1857) com seu cientificismo e a crença de que a ciência (racional e técnica) poderia salvar a humanidade de todos seus malefícios.
Enfim, a educação da escola tradicional ainda é muito presente e pode-se concluir que ela parte de pressupostos empiristas e indutivistas. A filosofia empirista afirma que nenhum conhecimento chega ao intelecto sem antes passar pelos sentidos, o mesmo acontece com a escola tradicional, ou seja, seu currículo, ao se preocupar com a realidade dos problemas práticos, privilegia a experiência e não a abstração. Ao mesmo tempo ela é indutiva, parte de problemas particulares para problemas universais, transmitindo a idéia que se uma teoria resolveu mil casos, poderá resolver todos os casos semelhantes, sem considerar a exceção.