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quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

OS QUATRO PERÍODOS HISTÓRICOS DA FILOSOFIA


Gerson N. L. Schulz

Professor do Ensino
Público Federal no Brasil







A Filosofia como ciência (aqui cabe a palavra ciência se se entende como episteme, donde vem a palavra epistemologia que significa conhecimento em grego) nasceu na Grécia, com Tales de Mileto (séc. VII a.C.).

Como ela tratava dos saberes e, principalmente, do acúmulo destes, ela foi considerada a "mãe" de todas as ciências. Entendendo-se ciência como aquilo que tem conteúdo, método e objeto de estudo. Então, a Filosofia é uma ciência. Dela derivaram ao longo do tempo todas as demais ciências particulares como a Matemática, a Biologia, a Antropologia, a História, a Psicologia e etc..

Deste modo, o filósofo (no mundo antigo) possuía o status que hoje é dado ao cientista. E, por isso, o filósofo procurava a verdade, por meio do uso da razão. Em função das diversas opiniões sobre a natureza da verdade, surgiram diversas escolas filosóficas. Grande parte delas privilegiou o estudo da Matemática, como foi o caso das escolas pitagórica, de onde vem a sistematização do famoso teorema (530 a.C.) e, também, da Academia conduzida pelo filósofo Platão (427 a.C. - 347 a.C.).

Logo, a preocupação dos filósofos no mundo antigo era "desmitologizar" o mito e os deuses e desvelar o Cosmos, investigando se ele continha regras, ordenamentos e, por conseguinte, que ordenamentos eram esses. Em outras palavras, a Filosofia surge para substituir as crenças religiosas da época por uma racionalização da natureza. Para a Filosofia, a verdade estava naquilo que se podia demonstrar pelo menos formalmente, isto é, por meio da lógica, da linguagem (discurso) e da Matemática.

À partir do ano de 486 d.C, há uma mudança nas formas do pensamento e, também, um grande fenômeno social e político que produz um "divisor de águas" (a queda do Império Romano do Ocidente) na história e surge, à partir daí, a idade Média.

No mundo medieval, o conhecimento que tinha supremacia sobre os demais era aquele adquirido por meio da fé cristã. Mesmo no mundo natural, aquilo que não se mostrasse em convergência com a fé era desclassificado como verdade. Então, ao contrário do mundo antigo, em que a razão prevalecia como método para estabelecer a verdade, no mundo do medievo, a verdade era um discurso que não podia ser provado pela Lógica nem pela Matemática, mas pela fé. De tal forma, qualquer ponto de vista para se tornar verdadeiro deveria, explicitamente, estar de acordo com as verdades da Bíblia (as chamadas 'verdades reveladas'). Considerava-se, assim, que os textos bíblicos eram, em si mesmos, a verdade, e, por isso, o homem não deveria perguntar para a natureza, para o universo, se neles havia alguma lei (como as que hoje sabe-se que há, de acordo com a Física), mas o que se entendia sobre a natureza era justamente, para merecer o título de "verdade", aquilo que o texto bíblico dizia ser ou insinuava ser.

Nesse momento da história da humanidade, à Filosofia coube o papel de ser "escrava" da Teologia, pois ela apenas servia para ordenar logicamente e tornar o discurso convincente, produzido pela religião cristã (ou pela religião árabe, em se tratando do mundo Oriental).

Na Modernidade, que surge a partir de 1453 com a invenção da imprensa por Gutenberg, das descobertas astronômicas de Galileu e geográficas de Colombo, em 1492, a igreja católica e a filosofia cristã entardecem. Agora, algo para ser chamado de "verdade" deveria ser demonstrado por meio da Matemática e das leis da Física.

René Descartes (1596-1650) foi o idealizador das ciências modernas. Ele tentou matematizar até mesmo a própria Filosofia para livrá-la das meras "opiniões" divergentes entre os vários filósofos e transformá-la em uma ciência (aqui nos moldes modernos, projeto no qual ele fracassou). A prova de fogo que qualquer tipo de conhecimento deveria enfrentar, à partir desse momento, para merecer o título de ciência, era o método científico. Caso um tipo de saber não fosse aprovado pelo crivo do método científico (que se esforça para comprovar aquilo que afirma), não poderia ser chamado de conhecimento científico. À partir do mundo moderno, a humanidade adota o modelo de pensamento de "causa e efeito". Isso significa que só é aceito o que tem explicação causal, como por exemplo, o fato da combinação de ácido sulfúrico (H2SO4) + hidróxido de sódio (NaOH) resultar em água (H2O) + cloreto de sódio (NaCl) + gás hidrogênio (H2).

Para a ciência, em fenômenos como este acima, não há a presença de nenhum "deus". Assim, o cientista não acredita que dentro do balão de vidro estejam água e sal de cozinha porque "deus" quis, mas porque há uma lei da química que garante o acontecimento dessa reação nas condições normais de temperatura e pressão (CNTP), bem como em qualquer lugar do universo, justamente, porque a lei tem validade universal.

Foi esse modelo de pensamento que culminou no projeto moderno do Iluminismo. Período moderno de grande progresso técnico-científico. O Iluminismo estabelecia uma sociedade voltada para as ciências, para a exploração da natureza, para seu desvelamento, para a conquista do conforto da humanidade (ainda que das pessoas que viviam na Europa). Era, também, em termos políticos, de cunho liberal e capitalista no campo econômico. Sua filosofia progressista apostava na soberania do indivíduo sobre a sociedade e, por isso, prezava pela garantia das liberdades políticas, mas apenas dos europeus e não dos povos colonizados, considerados inferiores.

Esse modelo filosófico exigia o fim do regime monárquico, especialmente na França (uma das nações europeias mais desenvolvidas), e foi o que a nova classe social francesa fez em 1789, organizando uma Revolução. A essa nova classe Marx (1818-1883) chamou de burguesia. A burguesia, sob o regime monárquico, detinha o poder econômico, uma vez que era proprietária das indústrias, das grandes casas de comércio e empresas marítimas, mas não detinha o poder político. Este estava nas mãos dos reis, que determinavam os valores dos impostos, quando e com quem os burgueses poderiam fazer negócios.

Durante os acontecimentos revolucionários, era interesse da burguesia derrotar a monarquia, pois, na República, acabaria a desigualdade entre os homens. Apesar da promessa de igualdade, liberdade e fraternidade, que justificava a Revolução, os acontecimentos posteriores mostraram que a burguesia, temendo perder suas posses,  optou por financiar o imperialismo bonapartista. Mas, mesmo assim, a experiência na França se espalhou para outros países da Europa e, pouco a pouco, as monarquias europeias ou desapareceram, ou se tornaram parlamentaristas. O ano de 1789 é considerado, pelos historiadores, o marco divisor entre a idade Moderna e a idade Contemporânea, que vem até os dias atuais.

Embora não seja consenso, chega-se, à partir de 1945, ao que se denomina Pós-modernidade. Para os defensores desse conceito que entende, entre outras coisas, que o projeto da idade Contemporânea (que é herdeiro da Modernidade) se esgotou, a Pós-Modernidade é diferente de todos os outros períodos históricos.

David Harvey é um dos pensadores que diz que a Pós-modernidade é resultado da II Guerra Mundial. Para ele, esse grande conflito pôs em xeque todo o projeto moderno, porque a tão sonhada racionalidade científica (que os iluministas apregoavam que salvaria a humanidade da ignorância) produziu a quase total destruição da Europa (com a Guerra e, também, uma arma até então nunca vista, a bomba atômica). Esse conflito mostrou, assim, que a "era nuclear" prestava-se para fins bélicos e de destruição total do Planeta Terra.

É aqui que os "pós-modernos" perguntam: "como a mesma ciência que produziu a penicilina, aumentou as expectativas de vida, o conforto tecnológico desde os tempos de Descartes, pôde produzir, também, tanta capacidade de destruição com a bomba atômica?

Essa pergunta pôs em crise a "promessa" das ciências modernas. Os cientistas e filósofos começaram a indagar sobre a validade das "verdades" científicas, e se essas "verdades" fizeram mais bem ou mais mal para a raça humana em geral. É, à partir daí, então, que se tem a Pós-modernidade. Tempo histórico em que se valoriza a pluralidade de saberes (onde o saber científico, de forma geral, é apenas mais um saber em meio a tantos outros). Onde uma parcela das pessoas se preocupa com o esgotamento da natureza e de seus recursos; outra, com os direitos dos animais; outra, com os direitos das chamadas minorias (comunidades indígenas, quilombolas).

A Pós-Modernidade é, então, a era da alta tecnologia (robótica e inteligência artificial, exploração interplanetária). Mas, também, é uma era de conflitos étnicos acentuados, de guerras não mais entre Estados-Nações, mas entre Estados-Nações e grupos armados (denominados terroristas).

Por fim, a era "Pós-Moderna" é conhecida como a "era das incertezas" e do relativismo científico, cultural, político e econômico. Uma era em que os valores modernos (a filosofia, a ética e a religião) se esgotam ou são abandonados ou, por outro lado, são radicalmente transformados em seitas e denominações particulares. Muda-se bastante a relação entre o homem e a divindade. Se antes Deus era um ente comunitário, que se manifestava na reunião das pessoas em comunidade para a partilha da existência, da comida e etc., agora Deus é algo pessoal, caso das igrejas neo-pentecostais, onde a relação com Ele é direta. Na Pós-Modernidade, a figura do líder religioso ainda existe, mas, diferentemente do padre que era o "intérprete" de Deus, o pastor é um tipo de animador de plateia. O cristianismo se descentraliza, cada vez mais, e as igrejas cristãs distorcem (ao gosto de seus fundadores) o cristianismo. A relação com Deus segue os moldes comerciais de pagamento de determinada quantia em troca do recebimento de favores da divindade aqui e agora.

A Pós-Modernidade é, também, o lugar onde o outro/próximo se torna um estranho, porque ele pode ferir "meus" interesses (querer me roubar, me matar). É o momento da desconfiança sobre as verdades científicas, de incertezas quanto ao futuro da sociedade e do mundo. Essa incerteza sobre o futuro pode ser sintetizada na frase: "a longo prazo todos estaremos mortos", atribuída ao economista John M. Keynes - 1883-1946. O que importa agora é o gozo da vida, por meio dos sentidos (estética). Os momentos de prazer devem ser aproveitados até seu esgotamento. Sentimentos, desejos, paixões devem ser vivenciadas ao extremo. Se o "slogan" da Modernidade era a frase de René Descartes: "penso, logo existo"; o "slogan" pós-moderno é: "sinto, logo existo", de Daniel Goleman.

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